sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Pretinho



Toda noite é a mesma coisa!
Com lua cheia ou com chuva, lá vai Pretinho perambulando pelas ruas desertas...
Ele é da noite!
Gosta das madrugadas, tanto faz se escuras ou estreladas.
Derrepente aparece Pretinho esbanjando charme e glamour não sei pra quem! Talvez para algumas gatas pingadas que também adoram andar no escuro.

Eu também gosto da noite, da noite eu sou e assim como Pretinho trocaria o dia pela noite e também, assim como ele, gostaria de passar o tempo inteiro me espreguiçando numa poltrona gostosa e macia.

A garoa começa e eu, mais uma vez, gente da noite, olho pela janela do meu primeiro andar e Pretinho aparece, atravessando a rua, nariz empinado, pingos de chuva molhando-lhe o corpo gordo e peludo.

Pretinho é o gato da Dona Arlete, uma senhora de meia idade que mora ao lado da minha casa.

Ela me confessou uma vez que Pretinho é o seu xodó e que ele tem uma poltrona especial na sala de estar.

“O danado só come bife mal passado!”

Agora descobri de onde vem tal rompante!

Pretinho só faz o que quer!

Dona Arlete acostumou-o muito mal, fazendo-lhe suas vontades e deixando-o livre para bater pernas pelas ruas do bairro.
Mas como se faz para prender um gato? Amarrando-lhe ao pé da mesa? Claro que não! Esses bichos nasceram para a liberdade e com Pretinho não seria diferente.

Desconfio que com o amor acontece o mesmo.
Às vezes queremos prendê-lo, sabendo que o seu desejo mais ardente é a liberdade. Pura liberdade e nada mais.

É assim que funciona as coisas, se deixarmos livre ele vem correndo, se prendermos ele escapa da gente, igualzinho a areia da praia que desliza entre os dedos quando a apertamos demais.

E o Pretinho? Esse gato danado de olhos de gude não deixa ninguém chegar perto, a não ser a sua protetora, Dona Arlete.
Ela é uma viúva de 62 anos, três filhos grandes e já de vidas feitas, moram fora. Vive com o neto, o João, mas Pretinho é realmente o chamego da casa!

Um dia ela me disse que tem medo de suas saídas, por ser um persa todo preto, sem uma única manchinha pra “manchar” o negrume do seu pêlo fofo e aveludado, teme que ele vá e não volte mais, seja por seqüestro ou por um acidente qualquer.

- Essa rua que a gente mora é muito movimentada, minha filha. Passa carro toda hora!

Dizia, toda preocupada.

Certa vez presenciei um acidente quase que fatal do pobre e formoso felino. Acredito que nessa hora Pretinho perdeu uma das suas sete vidas. Mas graças a Deus saiu são e salvo!

O negócio foi o seguinte: Final de expediente de uma sexta-feira, avenida movimentada e Pretinho do nada aparece na frente de uma moto. O piloto freou bem em cima do bichano que escapou por pouco. Mas nessa escapadela caiu embaixo de um fusca azulado que vinha na toda em direção contrária. Pretinho levou um trompaço tão grande que por sorte não foi esmagado pelos rodões do fusca 74.

Sorte essa que não permitiu que ele perdesse nem uma das suas vibrissas, embora nessa hora esses pêlos sensoriais não o alertou para o eventual perigo. Até parece que servem somente para enfeitar a sua cara de gato!

Confesso, gritei naquela hora! Caso acontecesse alguma coisa com o bichano eu iria sentir muito. Sou chegada a bichos, cachorros principalmente, gatos nem tanto, soltam pêlos e mijam em qualquer lugar. Mas meu apego com Pretinho vem de longe, desde que mudei pra essa rua. Olhos claros me encanta!

Eu, ele e a noite, madrugadas a fio, acordados.
Eu, trabalhando um pouco, fazendo pesquisas, arrumando papéis e Pretinho desfilando todo faceiro pela rua silenciosa em busca de novas aventuras. Acho que somos mesmos cúmplices da noite! Ela nos entende e nos embala com seus braços aconchegantes. Braços de mãe que cuida do filho com todo cuidado e carinho.

E é bem assim que também agimos quando apaixonados estamos. Queremos colocar no colo, ninar e acarinhar o amor verdadeiro.

Eu, ele, ela. Um triângulo amoroso com final feliz!


Lu Santos

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